A caneta rolou pelo chão e meus olhos seguiram seu caminho como um homem que, perdido em seu labirinto de emoções e devaneios, persegue sua sombra. Curiosa, quis saber até onde aquele pequeno objeto teria força para chegar e se seria capaz de passar por cima de tudo o que se impunha à sua frente, tudo que bloqueava seu caminho e tentava impedi-lo de atingir o destino final... Que era, enfim, algo vago e desnecessário, criado ali mesmo quando a caneta tocou o mármore liso e gelado. O mármore sempre fora frio. A caneta, não, mas rolava. Estaria fugindo de alguma coisa? Só sei que corria. Não parecia saber a razão. Vítima do maldoso acaso, escravizada por aquele movimento sem fim, não podia riscar palavra alguma, não podia fazer aquilo que, desde que se entendia por objeto manufaturado, sabia ser seu dever. Estava desesperada, mas não havia aprendido a gritar. Não aprendera nada além de ser tomada por mãos quentes – tão diferentes daquela imensidão plana sobre a qual vagava contra sua vontade – e desenhar histórias, apelos e amores sobre qualquer pedaço de papel. Um ímpeto de esticar o braço para a caneta e socorrê-la me invadiu, mas enxotei-o e permaneci alheia ao sofrimento mudo daquele objeto, que outrora me parecera tão inútil e vulgar. A caneta não sabia implorar, mas prendia minha atenção. Manteve-me em seu mundo durante certo tempo (quanto?) e então, de súbito, estancou. Parou assim mesmo como se nunca tivesse mudado de lugar. Parou ao lado do pé da mesa e ali ficou como se isso fosse muito natural. Para mim, já não era. A caneta me encarou com certo deboche, como se dissesse que eu perdera tempo em acompanhá-la até ali e que todo o furor atormentado que nela eu vira não passava de uma lamentável tentativa de fugir de todos os sentimentos que me sufocavam ou - quem sabe? - de um desejo suplicante de sentir qualquer coisa real, mesmo que não fosse minha. Aquele minúsculo pedaço de matéria desvendara mais sobre mim do que qualquer um jamais pudera. Assim que percebi o que acontecera, levantei-me da cadeira e saí da sala. Fugi de um inequívoco “eu”. Abandonei a caneta.
Escrita linda, amei o blog.
ResponderExcluirAbraço.
Genial! O que uma simples caneta não gera momentos epifânicos, não?
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